segunda-feira, 27 de julho de 2009

HAMLET(III) DIREÇÃO DE ADERBAL FREIRE FILHO


Shakespeare cai ferido no Leblon

Por Bárbara Heliodora

O "Hamlet" dirigido por Aderbal Freire-Filho não traz nada de novo ou desbravador e, a não ser por dois aspectos, seria um espetáculo perfeitamente tradicional. O primeiro é o corte radical de todo o lado político da peça, que rouba a Hamlet a oportunidade de dar seu voto a Fortimbrás, parte do desejo do príncipe de repor o reino nos eixos, pelo que, afinal, ele deu sua vida. O segundo afeta texto e interpretação: no original, a suposta loucura de Hamlet é claramente identificada pelo autor, pois, quando "louco", Hamlet fala em prosa, e, quando está em sua condição normal, em verso. É possível que a confusão tenha nascido da opção feita pelos tradutores de só usar prosa. Seja por isso ou não, o fato é que o príncipe assume o comportamento de "loucura" na peça inteira (a partir do momento em que a sugere). Com isso desaparece toda uma possibilidade de serenidade e reflexão que prejudica muito a interpretação do protagonista da obra.
A encenação tem um cenário interessante de Fernando Mello da Costa e Rostand de Albuquerque, que sugere cena e bastidores, com uma imensa tela onde vários momentos da ação são projetados, sem maior proveito para a compreensão do texto.
Direção, confusa, não explora o texto
Os figurinos de Marcelo Pies são fraquíssimos, os melhores sendo os que ficam em trajes simples e contemporâneos. É boa a luz de Maneco Quinderé e interessante a música de Rodrigo Amarante.
A direção de Aderbal é um tanto confusa, não dá para que se reconheça algum foco definido, parecendo muitas vezes que ele simplesmente deixou cada um fazer o que quisesse. A momento algum o pensamento do texto é explorado, pois todos gritam tanto que não é possível alcançar qualquer intenção ou sutileza.
A interpretação do elenco é toda ela prejudicada, de início, por uma gritaria sem fim, que parece sempre ser usada, em nossos palcos, como substituto da emoção e da projeção da voz. Wagner Moura, já rouco no final, apesar dos pesares, deixa bem claro que poderia fazer um bom Hamlet, se pudesse ser "louco" apenas onde Shakespeare indica, e é uma presença forte. O resto do elenco fica todo muito abaixo dele: o rei de Tonico Pereira é um bufão cafajeste, enquanto Gillray Coutinho faz um Polônio caricato e ridículo, que dificilmente poderia ser tido como um hábil político. Nada menos que cinco atores (Candido Damm, Fábio Lago, Felipe Koury, Marcelo Flores e Mateus Solano) fazem o Fantasma ao mesmo tempo, tirando a tensão do encontro de Hamlet com o pai, e vários outros papéis; só o último tenta dar uma certa dignidade a Horacio. Carla Ribas (Gertrude) e Georgiana Góes (Ofélia) são ambas fraquíssimas e maltratadas por seus figurinos.
No todo, esse "Hamlet" tem poucos momentos de impacto e, apesar de contar a história da peça, se perde na confusão de valores.

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